No dia do Frevo, maestro Spok enaltece o ritmo e diz que o Carnaval é o que lhe mantém vivo
Os 15 dias que antecedem a data oficial do Carnaval são intermináveis para o Maestro Spok, instrumentista e arranjador líder da Spok Frevo Orquestra. Ele comanda a festa em diversos bailes e prévias carnavalescas, recebendo nomes locais e nacionais da música popular.
No palco, o trabalho exige do músico um vigor físico similar ao de um atleta. Ele lidera a orquestra, toca o saxofone, canta, interage com outros artistas, dança os passos clássicos do frevo e ainda tem energia para abraçar a plateia. Tudo isso em apresentações que duram, aproximadamente, 2 horas e meia.
"Costumo dizer que ninguém ama mais o Carnaval do que eu. O Carnaval, a rua, é como se fosse uma vitamina pra mim. É o que me mantém vivo", disse o maestro em entrevista exclusiva ao Brasil de Fato para falar sobre o dia do frevo, celebrado neste nove de fevereiro, e também sobre as expectativas para o Carnaval 2024.
Ele conversou com a nossa equipe logo após o Baile Municipal da Pessoa Idosa, uma iniciativa da Prefeitura do Recife, realizada na última terça-feira, (07).
Na festa, a orquestra liderada por Spok costurou um repertório que trouxe canções clássicas do frevo pernambucano e composições de Moraes Moreira, Caetano e outros ícones da música popular brasileira.
Uma nova roupa para o frevo
O Frevo é celebrado em duas datas: 9 de fevereiro e 14 de setembro. Em 1907, em uma edição do dia nove fevereiro, o jornal O Pequeno, do Recife, escreveu pela primeira vez a palavra "Frevo". Para muitos pesquisadores, o dia transformou-se num marco para o gênero.
Em 2007, o frevo foi reconhecido como Patrimônio Imaterial da Cultura Brasileira e, em 2012, como Patrimônio Imaterial da Humanidade pela Unesco.
Spok é responsável por um importante momento no frevo, ao incorporar ao gênero genuinamente pernambucano uma nova roupagem, influenciada pelo jazz e outros ritmos. Ele já tem três discos gravados (Passo de Anjo, Ninho de Vespa e Frevo Sanfonado), em mais de três décadas de carreira.
Conviveu com importantes ícones do frevo, como José Menezes, Guedes Peixoto, Nunes, Clóvis Pereira, Duda, Edson Rodrigues, Ademir Araújo, e acumula participações em shows com nomes consagrados da MPB, como Gilberto Gil, Lenine, Elba Ramalho e Alceu Valença.
O maestro é um entusiasta da música instrumental e acredita que ela deve ser ensinada nas escolas, desde cedo, para as crianças. Ele defende que o ensino do frevo e outros gêneros pode ser uma importante ferramenta de transformação social.
"No meu caso, o frevo teve uma importância absurda na diminuição das dificuldades, para que meus sonhos fossem realizados. Tudo fica menos difícil", explicou o músico. "Eu tenho um sonho que isso uma dia vire uma disciplina escolar sistemática, sabe? Isso já é feito por muitos amigos que estão na cultura popular, mas isso tem que estar urgentemente no sistema das escolas."
Spok é idealizador do Instituto Passo de Anjo, entidade que desenvolve atividades formação artística para crianças e adolescentes em Abreu e Lima, na Região Metropolitana do Recife
As primeiras influências
Inaldo Cavalcante de Albuquerque, o hoje consagrado Maestro Spok, nasceu em Igarassu, em 1970. Começou a estudar música aos 13 anos e diz que já respirava toda a atmosfera do Carnaval dentro de casa.
"Minha mãe é uma grande foliã. Meu pai foi um grande folião. Minha casa sempre foi muito festeira. Sempre teve muito confete, serpetina, bombinhas de água".
Vassourinhas, frevo composto em 1909 por Joana Batista Ramos e Matias Rocha, foi a canção que despertou naquele adolescente o interesse pela música. Ele recorda também da presença constante no som doméstico dos grandes nomes do frevo naquela época, em Pernambuco.
"Os discos de Nelson Ferreira, Levino Ferreira, Claudionor Germano, Expedito Baracho, sempre estavam ali na minha casa. Ouvíamos muito Luiz Gonzaga também e muitos repentistas".
Em 2015, Spok foi um dos homenageados do Carnaval do Recife / Reprodução/Site Maestro Spok
O sotaque do frevo é pernambucano
Tocar frevo, para Spok, é como falar um idioma. Segundo ele, quem nasceu em Pernambuco tem mais facilidade para apreender a técnica e executar com a energia que o ritmo demanda.
"O frevo é uma música de um lugar. Ele não é diferente de um tango, que quem conhece são os argentinos; de uma música flamenca, que quem conhece são os espanhóis. Toda música tem sua complexidade, e o frevo tem a sua também", descreveu o maestro.
"Qualquer músico que toque bem o seu instrumento consegue executar o frevo. Talvez ele não consiga tocar, emocionar, porque tocar é diferente. Para tocar, você tem que conhecer o lugar, tem que conhecer o comportamento das pessoas", analisa, evidenciando que a execução do frevo, no instrumento, exige mais do que técnica: tem que ter sensibilidade, experiência social e envolvimento com a cultura geral pernambucana.
Apesar disso, Spok acredita que o gênero, que fala tanto de saudade e da resistência para permanecer vivo, renova-se e encontra boas vozes, abrindo novas possibilidades técnicas e rompendo fronteiras dentro do próprio ritmo.
"Se o trabalho da Spok Frevo Orquestra é considerado um trabalho que abre portas e janelas para as possibilidades, a nova geração está abrindo tudo de vez. Está tirando o telhado, assim, para as possibilidades e as fusões e as não proibições. Agora está tudo livre. E que bom que exista essa geração que nos faz ter a certeza de que o frevo está em belas, seguras e responsáveis mãos"