Partido de Bukele confirma hegemonia nos municípios de El Salvador e esquerda denuncia campanha de 'medo e terror'
A campanha que levou à vitória do partido Novas Ideias do presidente de El Salvador, Nayib Bukele, nas eleições municipais do último final de semana foi marcada por medo, terror e uma grande abstenção, aponta a ex-diplomata e coordenadora de campanha do partido de esquerda Frente Farabundo Martí para a Libertação Nacional (FMLN), Ena Hernandez.
“Devido ao desequilíbrio na campanha e ao medo e terror difundidos pelo regime de exceção de Bukele, não tínhamos nenhuma garantia de direitos humanos. Mesmo assim os militantes saíram para defender o partido, frente ao regime de exceção e sem os recursos que a oposição tem direito”, disse ao Brasil de Fato.
Bukele, que foi reeleito em fevereiro com mais de 80% dos votos e conta com 54 das 60 cadeiras no Congresso de El Salvador, conquistou 43 dos 44 municípios do país com seu partido Novas Ideias nas eleições do último final de semana.
Hernandez aponta uma medida aprovada em junho de 2023 pelo Congresso, que reduziu o número de municípios do país de 262 para 44, como o principal motivo da vitória governista nas últimas eleições.
“Oito meses antes das eleições não se pode modificar as regras, mas se fez uma nova distribuição geográfica. Eu pessoalmente acredito que os partidos de esquerda não deveriam participar, porque legitimam as regras.”
Após denúncias de fraude por parte da oposição, nas eleições de fevereiro que reelegeram Bukele para a presidência, Hernandez aponta que o comparecimento às urnas no último final de semana foi baixo. “As pessoas não foram votar depois das fraudes da eleição anterior, não quiseram ir votar. A abstenção foi o grande ganhador das eleições.”
Reorganização
Mesmo diante de um cenário desfavorável, a partir da sequência de vitórias de Bukele, a FMLN anunciou uma “reorganização total” de seu projeto político. “Depois destes resultados deve haver um novo começo”, apontou o secretário geral da organização, Óscar Ortiz.
“Cada crise deve ser encarada como uma oportunidade, este não é o fim, é o encerramento de uma etapa, é o fechamento de um período, e precisamos iniciar outro, esta esquerda tem que se repensar e repensar sua conexão com o povo salvadorenho", destacou em coletiva de imprensa.
Para Hena Hernández, é preciso discutir o pragmatismo da organização, nem que para isso seja necessário criar uma novo partido de esquerda para disputar as próximas eleições.
“A FMLN é uma organização histórica e um espaço de formação de quadros políticos, mas é necessário criar uma instância eleitoral. Estamos muito mal eleitoralmente, e isso desmoraliza a militância. A FMLN é uma união de cinco organizações políticas e militares, e está imersa em problemas internos muito fortes, há muitas correntes que dizem que é preciso criar um outro partido, mas nenhum quer tomar a iniciativa. É complexo, porque há toda uma história, éramos uma referência no país e hoje estamos aniquilados.”
Após o fim de 12 anos de guerra civil em 1992, a FMLN se desmobilizou e se transformou em partido político. Contudo, desde 2016, enfrenta desgaste pelos processos judiciais contra dois ex-presidentes salvadorenhos do partido, Mauricio Funes (2009-2014) e Salvador Sánchez Cerén (2014-2019). Ambos fugiram do país e se estabeleceram na Nicarágua, onde o presidente Daniel Ortega lhes concedeu a nacionalidade nicaraguense.
Em 2017, o FMLN expulsou de suas fileiras Bukele, então prefeito de San Salvador, que nas eleições de 2019 rompeu com o bipartidarismo direita-esquerda que imperava no país desde o término da guerra civil.
*Com AFP